O normal e o patológico

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O conceito de saúde e de normalidade na Medicina é questão de grande controvérsia (Almeida Filho, 2001). Essa problemática se insere principalmente nos casos limítrofes, em que a delimitação entre comportamentos e formas de sentir normais e patológicas é bem complicada. Nesse sentido, vale lembrar o grande estudioso no assunto, filósofo e médico, Georges Canguilhem (1978), autor do livro “o normal e o patológico”.

Nessa perspectiva, não se pode estudar o conceito de normalidade sem se debruçar também nos conceitos de saúde e doença mental. Além disso, essas definições são diferentes a depender da área de saúde mental, como por exemplo:

  • Psiquiatria legal e forense: esses conceitos possuem implicações legais, criminais e éticas, com capacidade de definir o futuro social, institucional e legal de alguém.
  • Epidemiologia psiquiátrica: esse campo possui a definição de normalidade como um problema e um objeto de pesquisa e trabalho. Assim, ela visa aprofundar esse debate conceitual.
  • Psiquiatria cultural e etnopsiquiatria: nessa área o fenômeno, supostamente patológico, é estudado com embasamento no contexto sociocultural em que se manifestou.
  • Planejamento em saúde mental e políticas de saúde: nesse ambiente, há de se estabelecer os critérios de normalidade para que as demandas assistenciais sejam atendidas e verificadas.
  • Orientação e capacitação profissional: necessário para definir a capacidade e adequação de um indivíduo a exercer dada profissão, utilizar máquinas, portar armas, dirigir veículos, entre outros.
  • Prática clínica: vale evidenciar a capacidade de discriminar, no momento de avaliação e planejamento clínico, se o fenômeno é patológico ou normal.

 

CRITÉRIOS DE NORMALIDADE

 

Os critérios de normalidade são diversos. Nesse sentido, o que faz o profissional adotar um ou outro critério depende das próprias opções filosóficas, ideológicas e pragmáticas (Canguilhem, 1978). Vale citar os critérios mais conhecidos em psicopatologia:

 

  • Normalidade como Ausência de doença: nesse prisma, a saúde é vista como “ausência de sintomas, sinais ou doenças”. Assim, o indivíduo normal é aquele não portador de transtorno mental definido. Pelo olhar crítico, esse critério é significativamente falho e redundante, em que define a saúde não pelo que ela é, mas sim pelo que ela não é, pelo que lhe falta (Almeida Filho; Jucá, 2002).
  • Normalidade ideal: nesse ramo, a normalidade é vista de forma utópica. Assim, estabelece-se a norma ideal, o suspostamente “sadio” e “mais evoluído” a partir de critérios socioculturais e ideológicos arbitrários, e, em algumas ocasiões, dogmáticos e doutrinários.
  • Normalidade estatística: o conceito de normalidade é visto como aquilo que se observa com mais frequência na população geral. Logo, ele se aplica a fenômenos quantitativos. Os indivíduos nos extremos das curvas de distribuição passam a ser considerados anormais ou doentes. Esse critério também é bastante falho, já que nem sempre fenômenos muito frequentes são um sinal de normalidade ou os extremos são, anormal. Pode-se citar como exemplo: cáries dentárias, uso abusivo de álcool, presbiopia, sintomas ansiosos e depressivos leves, entre outros.
  • Normalidade como bem-estar: a OMS definiu a saúde como “completo bem-estar físico, mental e social, e não simplesmente como ausência de doença. Esse conceito também, infelizmente, é criticável, já que é difícil defini-lo de forma objetiva, por ser muito vasto e impreciso. Além disso, pode-se cair na categoria de utopia, na qual poucas pessoas estariam realmente “saudáveis”.
  • Normalidade funcional: esse critério baseia-se na funcionalidade do ser, em que o fenômeno patológico é disfuncional a ponto de produzir sofrimento à própria pessoa ou ao seu grupo social.
  • Normalidade como processo: nesse sentido, a normalidade é vista de forma dinâmica, e não estática. Assim, há de se considerar os aspectos dinâmicos do desenvolvimento psicossocial, das estruturações e reestruturações ao longo do tempo, de crises e mudanças próprias do ciclo de vida da pessoa. Vale salientar que este conceito é muito aplicado na psiquiatria infantil, do adolescente e do idoso.
  • Normalidade Subjetiva: esse critério utiliza a perspectiva subjetiva do sujeito como a principal categórica na determinação do estado de saúde do mesmo. Esse quesito falha, infelizmente, nas pessoas em fase maníaca, em que se sentem “muito bem e saudáveis”, mas, na verdade, possuem um transtorno mental grave.
  • Normalidade como liberdade: vale citar que alguns estudiosos do ramo fenomenológico e existencial, como Henri Ey, creditam à doença mental como perda da liberdade existencial, como um constrangimento do ser, fechamento e fossilização das possibilidades existenciais.
  • Normalidade operacional: esse é um critério assumidamente arbitrário, com fins pragmáticos evidentes. Nesse contexto, as definições de normal e patológico são decididas a priori e, após, busca-se trabalhar com esses critérios, ciente das possíveis consequências deste ato.

 

Desse modo, há diversos critérios de “o normal e o patológico”, que devem ser estudados de maneira crítica e reflexiva. Nesse sentido, a finalidade não é julgar se um conceito é melhor do que outro, mas sim, estar atento à funcionalidade do conceito inserido em determinado fenômeno que se deseja trabalhar, lembrando que também há o viés filosófico do profissional. Além disso, alguns casos podem associar vários critérios de normalidade ou doença, de acordo com o objetivo de estudo.

 

REFERÊNCIA:

Dalgalarrondo, P. Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais. 2ª edição, 2007. Artes Médicas. Capítulo 3.

Faça aqui o download do mapa mental: normal_e_patologico.pdf

Vídeo para ampliar nos estudos:

1. PsicoLógicos #1 - Afinal, como saber o que é normal ou patológico? Canal: Psico Lógicos.